Passei os últimos três
anos vendo uma sombra. Uma sombra com um joelho que já não ajudava, com um
braço que ficou mais “curto”, com um ombro que sentia o peso do tempo. O que
vagava pelas quadras, com lampejos de genialidade, era quase um espectro que
carregava o rosto que havia pertencido a um grande gênio.
As estrelas, quando
começam a ficar sem combustível, vão se apagando, até que, em um último
espetáculo, explodem em uma supernova extremamente brilhante. Kobe foi uma
estrela de primeira grandeza e como tal, fez de sua última apresentação um
espetáculo de brilho intenso. Despediu-se seguindo o roteiro que praticou por
tantos anos e fez ressurgir na memória de todos a noção exata do que era um
jogo de Kobe Bryant.
Em um ginásio lotado de
fãs e amigos, Kobe deu início ao seu ato final, arremessava muito e a cada
ponto o ginásio vibrava como se fosse o último. Foram muitos últimos pontos.
Ainda assim o fraquíssimo time do Lakers permanecia atrás no placar. Uma
derrota já esperada, mais uma entre tantas que vieram esse ano. Não importava,
aquela noite era sobre se despedir e agradecer a Kobe. Shaquille O’Neal, que
foi amigo, virou desafeto e voltou a ser amigo de Bryant, havia pedido 50
pontos. Uma brincadeira, é claro. O recorde de um jogador na temporada que
estava terminando era 59, o de Kobe então, 38. O segundo quarto de partida
terminou com o Utah Jazz vencendo por uma margem relativamente confortável. Mas
sequer vou dizer o placar exato, nem lembro, não tem importância nenhuma.
O importante é que o
ginásio continuava vibrando, pois os últimos pontos continuavam se acumulando,
os 38 de melhor marca da temporada foram ficando perto, o público foi se
animando, a marca foi superada, e então era questão de fazer um jogo de 40 pontos.
Feitos os quarenta pontos. O Lakers mantinha-se perto do placar, o cronômetro
encaminhava-se para perto do fim e Kobe, como manda a cartilha, começou a fazer
ainda mais. Um furor começa nas arquibancadas com a proximidade de mais um jogo
de 50 pontos, pedido de amigo é pedido atendido. 51 na conta do Black Mamba, e
contando.
Nos últimos segundos de
jogo o Lakers perde por apenas um ponto, Kobe tem 56 e no ginásio e em frente às
TVs, todos desaprenderam a sentar. Bola na mão dele, só um na marcação e uma
cena vista inúmeras vezes. Kobe Bryant fez o que Kobe Bryant sempre fez, dia
após dia, nos últimos 20 anos. O arremesso decisivo é certeiro como uma flecha
élfica e põe o Lakers em vantagem pela primeira vez no jogo. Ainda viriam mais
dois pontos, para selar a vitória, para chegar em 60, para ficar com a melhor
marca da temporada.
Kobe presenteou o mundo com uma supernova apoteótica, inesquecível, mais
um apresentação de gala, uma última recordação magnífica para os que juntaram
tantas ao longo desses vinte anos.
O gênio derrotou o espectro, recuperou seu rosto e se reapresentou
“Prazer, eu sou Kobe Bryant”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário