quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Distâncias

Km 817. O destino, marcado assim no GPS, diz apenas que a estrada é longa. Não é através da voz robótica que descobrimos o grande, e ainda crescente, número de carros que trafegam por essas curvas sinuosas, desviando de buracos e cercados por um paredão de pedras que podem cair a qualquer momento e um penhasco onde o carro pode despencar feito uma pedra. É, a estrada é mal cuidada, fruto do pouco uso, muitos nem sabiam que existia. Esse fluxo mais intenso é recente.

A viagem só é possível graças a pessoas que tentam, diariamente, melhorar as condições, tirando o mato, melhorando a sinalização, etc. Algumas dessas pessoas estão organizadas em grupos, o que ajuda na manutenção de uma parte maior da estrada. O “Chega de Fiu-Fiu” é um desses grupos, vem melhorando a sinalização ao longo da estrada e, principalmente nas outras estradas, facilitando o acesso da população. Fico no carona, mexo no som, alcanço uma água para a motorista, mas em momento algum assumo a direção. É ela que precisa se manter atenta à estrada o tempo inteiro, manter as mãos no volante, pisar nos pedais. Esse desgaste não é, nunca foi, e não será meu.


Sou apenas um passageiro, fico sinceramente constrangido de cansar antes de quem dirige. Abaixo o meu vidro e encaro as ameaçadoras pedras, me certificando que nenhuma está vindo ao nosso encontro. Sinto os primeiros pingos da chuva que nuvens e ventos vinham anunciando e eu teimava em duvidar que viria, fecho os vidros e torço para que acabe logo. O pensamento de acabar logo me leva a concluir que já devemos estar na metade do caminho, afinal andamos bastante. Volto a olhar a estrada, o limpador de parabrisa dança freneticamente, melhorando a visão da motorista. Eu, que sou um passageiro, me distraio por um momento com os pingos que correm pelos cantos onde as hastes de silicone não chegam. Jair Bolsonaro é uma placa antiga onde leio: Km 11.

sexta-feira, 14 de novembro de 2014

A caneta repousa
Sobre o papel em branco
Nenhuma tinta cairá

A terra se desfaz na chuva
Morros viraram colinas
Ruas viram trilhas

Escorrego em uma flor de ipê-roxo
Meus papéis se vão ao chão

Os barros que agora invadem minhas páginas
Não são o Barros que eu ainda queria aqui

sábado, 21 de junho de 2014

Milagres

Quando estreou na Copa, contra a Bósnia, Messi (e toda a Argentina) estava mal. Ganhava por 1X0 mas os herzegovinos assustavam. Lionel recebeu a bola, dominou, arrancou, tabelou, chutou, vibrou com uma fúria que nunca tinha mostrado ao mundo. Os bósnios ainda diminuíram, mas não empataram, o primeiro gol de Messi salvou a Argentina no jogo mais difícil do grupo, teoricamente. Eis que chega o Irã, pressionando, criando chances, tendo um pênalti negado, transformando o goleiro argentino no nome do jogo. Até os 46 do segundo tempo. Aos 46 do segundo ele resolveu dar o ar da graça no jogo. Ele mesmo, o dez, o craque, o salvador, que recebeu a bola na entrada da área, cortou para o meio e disparou de canhota. A bola, como se tivesse vontade própria, desviou do defensor, escapou do abraço do goleiro iraniano e deitou-se na rede, descansando depois de um longo dia de trabalho.


Se os argentinos já tinham em Maradona um Deus para chamar de seu, agora contam com um Lionel Messiânico e após esse segundo milagre na Copa o Papa Francisco vaticinou: “Se fizer mais um eu canonizo” .

sexta-feira, 20 de junho de 2014

Passeios

Se ao menos fossem tortos teus caminhos
Eu teria a quem culpar por meus tropeços
Que me desabam sobre tuas calçadas duras

Com um impluso
Levanto em sobressalto
Com as mãos esfoladas
Limpo meus calejados joelhos

Ergo a cabeça
Sorrio, disfarço, sigo em frente
Alegre e confiante
De no próximo passo
Cair em ti novamente

terça-feira, 17 de junho de 2014

Cristiano "forever alone" Ronaldo


Quando há em um time um grande jogador, que é o referencial técnico de uma equipe
com outros jogadores de qualidade, nos referimos como “fulano e cia.”. A Argentina
é Messi e companhia, o Brasil é Neymar e companhia. Se o grande jogador, contudo,
estiver em um time em que todos os companheiros são apenas medianos, a equipe
é chamada de “fulano e mais dez”. A Bélgica é Hazard e mais dez. Há o caso das
equipes que não tem um “ fulano”, nenhum jogador se destaca como muito melhor
que os outros, para o bem e para o mal. A Alemanha não tem nenhum jogador
indiscutivelmente craque. Contudo a Alemanha tem jogadores bons em todos os setores do time,
incluindo o banco. O Irã é um exemplo sem “fulano” do outro lado.
Portugal não se enquadra em nenhum desses exemplos. Os lusitanos tem um grande
“fulano”, talvez o melhor da Copa, mas não tem “companhia”, sequer tem “mais
dez”. CR7 está sozinho, terá que ser um Atlas, carregando sua seleção na Copa até
onde der para ir. Dificilmente será além das quartas-de-final.


Bastidores: Uma fonte que prefere não se identificar informou com exclusividade
para o Blog do Schuster que Cristiano Ronaldo chegou no hotel onde Portugal se
hospedou, pegou algumas garrafas de vinho, e trancou-se no quarto, sozinho. O
silêncio da habitação de CR7 foi quebrado pela TV, com inúmeras reportagens
sobre o jogo. O VT completo começou a ser transmitido por volta da meia-noite e,
à medida que o placar enchia e a garrafa esvaziava, um choro baixo começou a ser
ouvido. Seguiu assim, contido, como um plano de fundo sonoro, durante o pênalti
convertido por Müller, a cabeçada de Hummels na bola, a cabeçada de Pepe em
Müller, e o chute de Müller de dentro da área. Porém, quando Rui Patrício escorou
a bola para Müller assumir a artilharia da Copa, o choro explodiu estrondoso. Já era
alta madrugada e ainda podia se ouvir, no corredor, um voz embriagada cantando
aos prantos:

“All by my self,
 Don’t want be.
 All by my self,
 Anymore.”

terça-feira, 20 de maio de 2014

ÁGUA NO JOELHO TIRA CRAQUE DA COPA

Dá-se assim a tragédia. Um jogo no final de uma temporada extenuante, em altíssimo nível, o corpo no limite. Um jogo que já não decide mais nada, ou quase nada, pois é nele que um menisco se rompe, águas invadem o joelho como um pororoca e a Copa perde seu maior valor.

Ainda há Cristiano Ronaldo, Messi, Neymar, Yaya Touré e tantos outros que podem nos brindar com seus grandes lances. Mas a magia, o talento sobre-humano, as jogadas divinas, tudo isso será negado para bilhões de pessoas. Consuelo está fora da Copa. Sem Consuelo a grama é menos verde, o Sol é menos quente e a chuva menos molhada. Sem Consuelo, a Copa é menos Copa.

O tempo dirá quem foi melhor, CR7 ou Consuelo “O MAGO”  Valduga, mas um larga na frente, um já tem o seu nome na história. Consuelo: o primeiro jogador a ficar fora da Copa do Mundo por ter que tirar água do joelho.